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Projeto coordenado pela UFC resulta em primeira autópsia minimamente invasiva da história do CE

"A partir desta data, a história da patologia no Ceará dá um salto." Assim o Prof. Luciano Pamplona, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, resume a importância do procedimento realizado no último dia 27 de janeiro, no Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) Dr. Rocha Furtado ‒ equipamento do Governo do Estado. Pela primeira vez no Ceará, foi feita uma autópsia utilizando a técnica "minimally invasive autopsy" (autópsia minimamente invasiva ‒ AMI). A conquista é resultado de um projeto desenvolvido na UFC, com a contribuição de várias instituições, pesquisadores e alunos.

Em linhas gerais, a AMI consiste em um método no qual o médico patologista pode investigar a causa de um óbito (o motivo pelo qual uma pessoa morreu) usando apenas agulhas para colher pequenos fragmentos de órgãos. Com isso, não há necessidade de abertura do corpo, como ocorre na técnica tradicional. Um dos principais ganhos é a possibilidade de maior chance de identificar se determinadas mortes ocorreram por fatores relacionados às arboviroses, sobretudo dengue, chikungunya e zika. Até então, apenas o Estado de São Paulo realizava autópsias por meio desse processo.

Equipe que realizou a autópsia, totalizando quatro pessoas, posicionadas lado a lado; elas estão em uma sala e vestem uniformes verdes, máscaras e toucas; em primeiro plano, há um cadáver coberto com saco plástico, sendo que imagem do cadáver foi desfocada (Foto: Divulgação)

"Será um grande avanço não apenas para a segurança dos profissionais que fazem a autópsia mas para a tranquilidade das famílias, que, por várias razões, não autorizavam o procedimento de autópsia completa. Isso vai gerar mais sensibilidade no sistema de vigilância para suspeição de óbitos por arbovírus e, com um maior número de autópsias realizadas, teremos o real cenário de mortalidade por cada doença", explica Pamplona, que é vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Patologia da UFC.

IMPORTÂNCIA ‒ Como exemplo da importância desse diagnóstico, ele cita o caso da chikungunya. Quando surgiram os primeiros casos nas Américas, havia o entendimento de que não se tratava de uma doença tão letal. Com o tempo, porém, estudos desenvolvidos no Brasil (principalmente no Ceará) mostraram que a enfermidade havia causado muitos óbitos, principalmente entre a população idosa.

"Se conseguirmos uma maior adesão das famílias para permitir a autópsia dos idosos, teremos mais chances de provar que essa doença é mais grave e direcionar políticas públicas para isso", enfatiza o biólogo e epidemiologista. Além disso, acrescenta, o procedimento é fundamental na detecção de novas doenças que possam vir a surgir.

PESQUISA ‒ A pesquisa que servirá de base para a implantação da técnica de AMI faz parte dos projetos de doutorado e de mestrado, respectivamente, das médicas Deborah Nunes, aluna da primeira turma do doutorado em Patologia da UFC e atual diretora do SVO, e Tânia Mara Coelho, aluna do mestrado em Saúde Coletiva da UFC e atual diretora do Hospital São José de Doenças Infecciosas.

Médica injetando agulha para colher material de um corpo (Foto: Divulgação)

Deborah Nunes diz que o projeto era um sonho dela e de seus colegas patologistas, que viam a técnica sendo usada em outros países. Trazer essa inovação para o Ceará, segundo ela, foi "um presente e uma grande oportunidade", viabilizada com sua entrada no doutorado em Patologia. A médica ressalta ainda a importância de poder investigar as causas de morte sem demandar tanto tempo para a família e sem a necessidade de abrir o corpo, procedimento muitas vezes rejeitado pelos familiares.

Após ter passado pelo treinamento em São Paulo, Tânia Mara diz ser possível que, em breve, o Ceará tenha vários profissionais treinados e capacitados a implementar a técnica nos hospitais, nos casos em que a família não permitir o envio do corpo para autópsia completa no SVO. Ela destaca a segurança da técnica, já que não há abertura completa do corpo, além do potencial como pesquisa, visto que o procedimento possibilita colher amostras biológicas de quaisquer órgãos em curto espaço de tempo.

PROJETO ‒ O projeto que resultou na realização do procedimento foi financiado pelo Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS). Intitulada "Validação da técnica de autópsia minimamente invasiva (minimally invasive autopsy ‒ AMI) para ampliação da sensibilidade da vigilância de óbitos por arboviroses no Ceará, Nordeste do Brasil", a iniciativa foi viabilizada a partir do interesse do Ministério da Saúde em validar o uso da técnica no País. O Ceará foi escolhido em virtude da experiência do grupo que estuda arboviroses, especialmente na UFC, liderado pelo Prof. Luciano Pamplona, que coordena o projeto.

Imagem: Três profissionais de saúde fazem o procedimento de autópsia em um corpo; eles trajam uniformes verdes e usam máscaras; dois estão de costas e outro, de frente (Foto: Divulgação)

A partir de uma primeira conversa com a SVS/MS, foi efetivada a colaboração com o grupo do Departamento de Anatomia Patológica e de Microbiologia do Hospital Clínic de Barcelona e Instituto de Salud Global de Barcelona (ISGlobal). Além disso, a parceria mais recente, que tornou possível o início do projeto mesmo durante a pandemia de covid-19, deu-se com o professor e patologista Paulo Saldiva, coordenador da Plataforma de Imagem na Sala de Autópsia (PISA), da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

Deborah Nunes e Tânia Mara Coelho foram treinadas por Saldiva e sua equipe e serão as responsáveis por implantar a técnica no Ceará. Para os próximos meses, está prevista a vinda de especialistas de Barcelona e de São Paulo, a fim de promover capacitações no Estado.

O projeto de pesquisa ainda está em estágio inicial. Os próximos passos consistem na realização de mais procedimentos e no treinamento de profissionais de saúde para expandir a utilização da técnica no Ceará. A partir dos resultados dos estudos, a expectativa é que o Ministério da Saúde amplie e incentive o uso da AMI no País.

PARCERIAS ‒ O projeto conta com a parceria da Secretaria da Saúde do Estado do Ceará (SESA-CE), do Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) Dr. Rocha Furtado, do Hospital São José de Doenças Infecciosas (HSJ) e do Laboratório Central de Saúde Pública (LACEN-CE). Conta ainda com professores e pesquisadores da UFC, do Centro Universitário Christus (UNICHRISTUS) e da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ/CE), além de alunos de pós-graduação e de iniciação científica.

Fonte: Prof. Luciano Pamplona, vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Patologia e coordenador do projeto ‒ e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

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