- Segunda, 27 Março 2017 12:03
Quanto mais elevado o nível da atividade científica brasileira, menor o número de mulheres presentes. O chamado "efeito tesoura", que "corta" a presença feminina ao longo da carreira, e outras dificuldades enfrentadas por pesquisadoras no País foram apresentados, na última sexta-feira (24), para estudantes e servidores docentes e técnico-administrativos da Universidade Federal do Ceará na palestra "As mulheres na ciência: avanços e desafios".
Ministrada pelas professoras Márcia Cristina Bernardes Barbosa, do Curso de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e Rosana Pinheiro Machado, do Departamento de Desenvolvimento Internacional da Universidade de Oxford, Inglaterra, a exposição foi realizada no Auditório José Albano, na área 1 do Centro de Humanidades (CH), e mediada pela Profª Irlys Barreira.
FORMAÇÃO NA INFÂNCIA – Além de apresentar o "efeito tesoura", presente na realidade científica de todos os países, a Profª Márcia Barbosa destacou, ainda, estudo divulgado recentemente pela revista Science com crianças. A pesquisa apontou que, até os 5 anos, meninos e meninas atribuem tanto a homens quanto a mulheres o perfil de uma pessoa inteligente. A partir dos 6 anos, a maior parte das crianças costuma indicar que pessoas com esse perfil sejam homens. A mesma pesquisa mostrou ainda que uma pessoa com perfil extrovertido, que fala muito, é indicada como sendo mulher pela maior parte de crianças a partir dos 6 anos. "Estamos condenando nossos homens a serem inteligentes e antipáticos. É isso que a sociedade espera: que as mulheres sejam queridas e simpáticas e façam listas de compras."
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Em meio a aplausos do público, a física concluiu: "Se eu puder deixar alguma mensagem é que é já, não é amanhã, é já! Nós temos de discutir esse assunto, mas não só discutir, fazer coisas. Olhe seu departamento, sua sala de aula, seu condomínio, a sua volta, e identifique barreiras para mudar, transpor essas barreiras. Juntos e juntas. Esse não é um trabalho só para mulheres, porque ele vai ser um trabalho libertador para os homens; eles vão poder ser simpáticos".
SITUAÇÕES CONCRETAS – Alunos que viram o rosto em sala de aula diante da professora especialista em produção, mercado e consumo na China, tema reconhecido como "masculino". Homens que dividem mesa em palestra para, em tom professoral, tentar explicar meandros de um assunto sobre o qual a colega, muitas vezes, é mais capacitada para falar. Essas são apenas duas das situações que a Profª Rosana Machado está habituada a vivenciar e a compartilhar com outras mulheres na carreira acadêmica na área das ciências humanas.
"A imagem de um intelectual nas ciências sociais é de um homem, careca, geralmente com uma cara séria, que fala de uma maneira que ninguém compreende", aponta. O efeito nos estudantes, ao contrário da busca por uma linguagem mais simples, é o de reproduzir o modelo, "muitas vezes falando coisas que não têm o mínimo sentido", argumenta.
As dificuldades de mobilidade acadêmica por mulheres e os assédios sofridos no ambiente universitário, em todos os níveis, também foram destacados pela docente da Universidade de Oxford. Para Rosana, "não devemos ter medo de denunciar, de trazer à tona". Ela também defende a prática da chamada sororidade: "é preciso que as mulheres se ajudem".
DISCUTIR PARA EVOLUIR – A abertura do evento foi feita pela diretora do CH, Profª Wládia Borges. "Quanto mais nós, mulheres, avançamos nos níveis de educação, mais avançam as dificuldades", avaliou ao ressaltar a importância da discussão do tema. Compondo a mesa de honra do evento, o Reitor da UFC, Prof. Henry de Holanda Campos, também fez questão de enaltecer o debate. "É preciso que haja o mesmo espaço e a mesma oportunidade na pesquisa e na ciência. Precisamos discutir esses valores para que possamos evoluir como instituição", afirmou.
A Profª Danyelle Nillin Gonçalves, vice-diretora do CH, também falou aos presentes, indicando a necessidade da temática. "Muito se fala da sub-representação das mulheres no âmbito da política e em muito menor medida se fala sobre a questão das mulheres na ciência", apontou. Expondo dados da UFC, a docente afirmou que "em geral, na iniciação científica, as mulheres são maioria, mas quando se chega ao mestrado, já começa a diminuir a distância em relação aos homens e, no doutorado, essa tendência já se inverte".
O Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da UFC, Prof. Antonio Gomes, destacou a influência das mulheres em sua trajetória acadêmica, desde a alfabetização, no sertão cearense, por sua mãe, até a orientação de doutorado pela Profª Mildred Spiewak Dresselhaus, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). "É preciso incentivar a complementaridade de mulheres e homens na ciência, porque os grupos de pesquisa rendem melhor, o ambiente é melhor e tudo funciona", defendeu.
Fonte: Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da UFC – fones: 85 3366 9442 e 3366 9443