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Patrimônio: Arquitetura elabora pedido de tombamento e registro do terreiro de candomblé mais antigo do Ceará

Os professores Romeu Duarte e Mario Fundarò, do Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Design (DAUD) da Universidade Federal do Ceará, atendendo à solicitação da comunidade do Ilè Igbá Asè Possun Aziri, terreiro de candomblé no bairro do Dendê, em Fortaleza, coordenaram a elaboração da instrução que pede o tombamento e registro dessa que é considerada a mais antiga casa de candomblé do Estado. "Uma vez tombada e registrada, será a primeira manifestação do candomblé em nossa terra a ser protegida, o que colocará o Ceará no mapa dessa expressão no Brasil", ressalta o Prof. Romeu.

O documento será encaminhado, nesta sexta-feira (25), para apreciação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Ceará (IPHAN-CE), da Secretaria da Cultura do Estado (SECULT), e Secretaria da Cultura de Fortaleza (SECULTFOR). O trabalho resulta de um esforço que uniu pesquisa e extensão, através de dois laboratórios do DAUD: o Atelier de Patrimônio Cultural, coordenado pelo Prof. Romeu, e o CANTO – Escritório-Modelo de Arquitetura e Urbanismo, sob coordenação do Prof. Mario.

Imagem: O Olubajé, banquete do rei, festa dedicada ao orixá Omulu, integra as manifestações que podem ser enquadradas como patrimônio imaterial do terreiro (Foto: acervo do Ilè Igbá Asè Possun Aziri)

O pedido de tombamento se refere ao aspecto do patrimônio material do terreiro (construções e demais espaços, bem como espécies vegetais que cumprem papéis nas religiões de matriz africana e outros bens físicos). Já o pedido de registro é referente à parte imaterial (celebrações, "saberes e fazeres do lugar"), como explica o Prof. Romeu.

Bolsistas da UFC, além de integrantes da casa de candomblé (dentre estes historiadores, sociólogos e antropólogos) colaboraram para demonstrar a importância dos aspectos históricos, arquitetônicos, urbanísticos, culturais e antropológicos do Ilè Igbá. Como citado no documento, foram realizados esforços de pesquisa bibliográfica, inventários métricos, gráficos e fotográficos, entrevistas e levantamento de imagens e iconografia para constar na instrução.

"Fizemos estudos da implantação do terreiro no Dendê, os pais de santo pioneiros, suas trajetórias, o funcionamento da casa, a estrutura, os diversos espaços de devoção; fizemos análise dos ambientes, fizemos também uma análise dos problemas construtivos e uma série de recomendações", comenta o Prof. Romeu.

Ele esclarece que o trabalho envolveu muita pesquisa aplicada do conhecimento do candomblé e de sua implantação em Fortaleza e no Ceará, de forma a esclarecer o que significa ter um terreiro numa zona periférica da Capital e a sua relação com o entorno. Sobre a relação com a vizinhança, ele observa: "O terreiro funciona como uma espécie de casa de apoio. Ali há muitas mazelas sociais, o bairro é muito pobre". Quanto ao cotidiano do terreiro, o professor ressalta que "ele funciona sem parar, 24 horas por dia, atendendo as pessoas nos ritos mais diversos".

CASA MÃE – O Ilè Igbá Asè Possun Aziri está situado na rua Campo Maior, 356, com acesso pela avenida Bernardo Manuel. Fundado em 2 de julho de 1975, por Pai Del de Oxum e Pai Xavier de Obaluayê, babalorixás que despertaram o candomblé em Fortaleza, é dirigido hoje pelo babalorixá Shell ty Obaluaye, filho de Pai Del.

Além de ser uma casa matriz de onde se originaram pelo menos outras 12 casas de candomblé na Grande Fortaleza, o Ilê Igbà tem, em suas origens, vivência nas práticas religiosas do culto nagô-vodun e, atualmente, nas práticas da Nação Ketu, sendo "exemplar capaz de congregar o patrimônio cultural afro-brasileiro", de acordo com o documento. Naquele espaço cerca de 200 pessoas do Ceará, de outros estados e países foram iniciadas no candomblé.

Imagem: Para elaborar a instrução, a equipe da Arquitetura fez um levantamento de todos os ambientes do terreiro, como o salão, e das manifestações realizadas no local (Foto: acervo do Ilè Igbá Asè Possun Aziri)


O babalorixá Shell ty Obaluaye considera "muito importante para a comunidade do Ilè Igbá Asè Possun Aziri o apoio da equipe [do Departamento] de Arquitetura da UFC, uma instituição tão respeitada. Nós nos sentimos amparados". Para ele, o tombamento e o registro da casa e suas manifestações como patrimônio material e imaterial de Fortaleza e do Estado serão de muita relevância. Ele entende que será o reconhecimento dos poderes públicos à resistência do povo de religiões de matriz africana e à casa como uma instituição que vem mantendo a tradição no culto dos orixás no Ceará.

PAPEL SOCIAL DA UFC – Joécio Dias (ebomy Joécio ty Oxossi, sua denominação de iniciado) foi quem fez a articulação da casa com os professores do DAUD e também participou ativamente da organização do material que serviu para embasar a instrução a ser encaminhada às autoridades. Sobre a parceria, ele afirma que é "a Arquitetura da UFC cumprindo seu papel social de produzir e compartilhar conhecimentos".

Ele considera de grande valia o apoio recebido. Segundo Joécio, a equipe ajudou na compreensão de conceitos de território, de tombamento, de registro, de patrimônio material e imaterial, além da colaboração dada quanto a aspectos jurídicos. Ele cita ainda o auxílio quanto a questões de estética, como desenhar os espaços, como elaborar as plantas para inserir no documento e como formatar o próprio documento final. "O Curso de Arquitetura possui muitas ferramentas que a gente ainda não domina", diz.

Imagem: Do patrimônio do terreiro faz parte a Gameleira, chamada de Tempo, considerada sagrada por ser o assentamento do orixá Iroko, que rege o tempo e a ancestralidade (Foto: acervo do Ilè Igbá Asè Possun Aziri)

Para Joécio, vale ressaltar também a forma respeitosa como a equipe da Arquitetura entrou em locais sagrados – normalmente fechados para o público em geral – para proceder ao levantamento. “Foi uma participação muito ativa no sentido de descrever o ambiente, descrever até mesmo de forma ritualística a importância desses espaços sagrados, que significação esses espaços têm para a comunidade tanto do terreiro como a comunidade do entorno", acentua.

Fontes: Prof. Romeu Duarte – e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.; Prof. Mario Fundarò – e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo., ambos do Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Design da UFC

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