- Sexta, 31 Julho 2020 08:51
Mais velozes e eficientes, os computadores fotônicos prometem ser o novo paradigma na arquitetura de hardware. Utilizando a luz para processar dados – ao invés de elétrons, como ocorre atualmente –, essas máquinas só existem, entretanto, no plano das ideias. Mas resultados de uma pesquisa que tem como um dos coordenadores o Prof. Eduardo Bedê Barros, chefe do Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará, podem conter os elementos decisivos para trazer a ficção à realidade. Não à toa, o potencial revolucionário do estudo o levou a ser publicado, neste mês de julho, na mundialmente renomada revista Nature.
O artigo denominado "Deep strong light-matter coupling in plasmonic nanoparticle crystals" ("Acoplamento profundo entre luz e matéria em cristais plasmônicos de nanopartículas") traz esses avanços, que estão na esfera da nanociência, área que estuda propriedades da matéria a partir de estruturas microscópicas, de escala nanométrica (1 nanômetro = 1 bilionésimo do metro). Esse universo já vem sendo estudado pelo Prof. Eduardo Bedê há 15 anos e, há dois, ele iniciou a atual pesquisa. O estudo foi feito em parceria com seu ex-aluno de doutorado Bruno Gondim Vieira, com grupos liderados pela Profª Stephanie Reich, da Universidade Livre de Berlin, e pelo Prof. Florian Schulz, da Universidade de Hamburgo, ambas na Alemanha.
"Quando iniciamos a colaboração no estudo desses materiais e de suas propriedades, eu não tinha qualquer ideia de que isso levaria a algo tão interessante e revolucionário”, aponta o professor. Na pesquisa, foram utilizados cristais formados por minúsculas bolinhas de ouro, criando uma interação com a luz de forma tão forte e jamais igualada que a natureza da luz se modifica, criando uma nova "molécula" formada da mistura entre essa luz e os elétrons (partículas que giram ao redor do núcleo do átomo) das bolinhas de ouro.
Para esclarecer isso, o professor cita o exemplo da água, que é formada pela molécula de H2O. Dois átomos de hidrogênio se unem a um de oxigênio para formar a molécula da água. Da mesma forma, no experimento utilizado, as partículas de luz, chamadas fótons, unem-se aos elétrons do ouro formando essa nova "molécula". E qual a importância disso? O professor explica: "os materiais obtidos e estudados neste trabalho podem ser a pedra fundamental para o desenvolvimento de computadores fotônicos".
Eduardo Bedê conta que os atuais computadores utilizam elétrons para realizar o processamento de dados, mas o problema é que essas partículas dissipam muita energia. "Por esse motivo, os nossos computadores esquentam. Além disso, a velocidade de processamento é limitada pela massa do elétron: quanto maior a massa, menos rápido pode ser o computador. Fazer o processamento com luz permitiria velocidades maiores de processamento, além de menos dissipação de energia", esclarece.
Não é a primeira vez que a ciência conseguiu realizar a interação entre luz e matéria. O artigo publicado da Nature, contudo, ganha destaque por dois motivos: um deles é que o experimento quebra todos os recordes quanto ao nível de interação atingido; o outro é que a experiência foi feita diretamente em um material, palpável e estável, podendo, portanto, ser reproduzido fora do ambiente laboratorial. "Isso permite a realização de vários experimentos científicos antes inacessíveis. A consequência disso é que eles podem ser diretamente aplicados em soluções tecnológicas", aponta o pesquisador.
NOVAS PERSPECTIVAS – O Prof. Eduardo Bedê explica que a sua contribuição para esse estudo, juntamente com Bruno Gondim Vieira, foi de natureza teórica, desenvolvendo os modelos matemáticos que ajudaram a compreender as propriedades desse material. Ele adianta que, no momento, a pesquisa evolui em duas direções, que levam a perspectivas animadoras.
A primeira delas consiste em buscar novas estruturas a partir da combinação de diferentes partículas metálicas, o que pode culminar na inauguração de uma nova área de engenharia de materiais fotônicos, "na qual podemos controlar as propriedades desses materiais de uma forma análoga à que utilizamos na engenharia de materiais eletrônicos", indica.
A outra direção consiste em estudar materiais bidimensionais formados a partir dessas estruturas, "ou seja, em vez de termos várias e várias camadas de nanopartículas, termos somente uma ou duas camadas. Esses sistemas podem apresentar outras propriedades interessantes, além de termos como manipular essas propriedades externamente", elucida o pesquisador.
EXCELÊNCIA INTERNACIONAL – Eduardo Bedê Barros tem graduação, mestrado e doutorado em Física pela UFC. O Programa de Pós-Graduação em Física (PPGFis), no qual Eduardo Bedê hoje atua como professor permanente, possui reconhecida excelência internacional, sendo nota máxima (7) em todas as avaliações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
O marco inicial da pesquisa citada deu-se quando a Profª Stephanie Reich, da Alemanha, veio a Fortaleza para a 25ª Conferência Internacional de Espectroscopia Raman (ICORS 2016) e, aqui, conversou com Eduardo Bedê (o qual já a conhecia do Instituto Tecnológico de Massachussets – MIT, onde ele fez estágio sanduíche) sobre as pesquisas de interação de nanopartículas de ouro com a luz que ela realizava.
A conferência que trouxe a pesquisadora foi promovida pela UFC (com organização do Prof. Antonio Gomes de Souza Filho), pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade de São Paulo (USP). Foi a primeira vez que o evento ocorreu na América Latina e, na ocasião, a UFC assinou memorando para cooperação com instituições de ensino e pesquisas alemãs na área de tecnologia fotônica.
Fonte: Prof. Eduardo Bedê Barros, do Departamento de Física da UFC – e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
Por Sérgio de Sousa